Em 14/07/2022, foi publicado parecer de nº 00004/2020/GABIN/PFE-IBAMA, visando consolidar o entendimento jurisprudencial da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 1.318.051, o qual atribui efeito vinculante para todas as decisões administrativas proferidas pelo IBAMA, ou seja, deverá ser observado obrigatoriamente nos processos administrativos que tramitam neste órgão.
Na prática, a decisão consolida junto ao órgão ambiental federal o entendimento jurisprudencial vigente de que a responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva. Deste modo a condenação administrativa por dano ambiental exige demonstração de que a conduta tenha sido praticada pelo transgressor com dolo ou culpa, além da prova do nexo causal entre a conduta e o dano ambiental.
Dessa forma, determinado dano ambiental ocasionado sem que subsista relação entre a conduta do agente e o resultado, não será suficiente para imputar sanções administrativas. As condutas do agente podem ser dolosas, quando quis o resultado e assumiu o risco de produzi-lo, ou culposas, quando o dano ambiental for ocasionado por ação negligente, imprudente ou de imperícia.
A consolidação do entendimento jurisprudencial pelo órgão ambiental busca estabelecer limites legais para atuação dos agentes fiscalizadores. Este afasta a aplicação de sanções administrativas com base na teoria da responsabilidade objetiva. Segundo esta teoria, independentemente de ação dolosa ou culposa, bastando o nexo causal entre o acidente e dano ambiental, cabe a aplicação de multas ou sanções restritivas aos direitos de propriedade como suspensão de licenciamento, autorizações ambientais e apreensão de bens.
Neste sentido dispõe o referido parecer:
“O que se demanda, isso sim, é a demonstração que foram atos dolosos ou culposos realizados em nome de uma pessoa jurídica que levaram a cabo uma infração ambiental, sendo a discussão dos agentes envolvidos eventualmente relevante para fins de dosimetria ou mesmo responsabilização pessoal desses.”
Desta maneira, ao lavrar Auto de Infração, o agente fiscalizador deverá obrigatoriamente indicar de maneira clara e objetiva que o dano ambiental em questão se deu por ação dolosa ou culposa do autuado. Assim, caso o Auto de Infração, não esteja subsidiado destas informações, o mesmo conterá vícios insanáveis e consequentemente deve ser declarado nulo pela autoridade julgadora.
Traçando um paralelo para o setor de transporte de produtos perigosos, muitas vezes os acidentes têm causa por situações que fogem ao controle do próprio condutor, como condições precárias das rodovias brasileiras e interferência direta de terceiros. Nestes casos, mesmo inexistindo ação culposa ou dolosa do condutor ou da transportadora, é comum que sejam aplicadas infrações administrativas genéricas pela ocorrência de dano ambiental.
A publicação da consolidação jurisprudencial no órgão ambiental federal representa um avanço para o direito de defesa, pois a partir deste entendimento são traçados limites legais para atuação da fiscalização ambiental, cabendo ao agente público descrever no auto de infração de maneira transparente os fatos e evidências que confirmem que a conduta do transportador foi diretamente responsável pela ocorrência do dano ambiental. Diante deste entendimento, situações como a descrita acima não deverão implicar em responsabilidades à transportadora.
Por fim, aos transportadores, recomenda-se que na eventualidade da ocorrência de acidentes busquem realizar imediatamente os comunicados dos fatos aos órgãos responsáveis, acionando na sequência os procedimentos estabelecidos em seu Plano de Atendimento à Emergência.
Aconselha-se que no momento da lavratura do Boletim de Ocorrência fique claro qual a real responsabilidade da empresa pelo fato, já que as informações previstas no Boletim de Ocorrência configuram-se como meios de provas essenciais para desconstituir eventuais infrações administrativas ambientais.
Além disso, a realização de uma perícia independente deste acidente, será de extrema relevância para confirmar as causas reais de eventual acidente e havendo ausência de culpa ou dolo da empresa ou condutor, restará afastada a imposição da responsabilidade administrativa pelo dano ambiental.
Fernando Persechini Cortes de Araujo – assessor juridicoambiental do SETCEMG e sócio do escritório Rocha Cerqueira – Sociedade de Advogados. OAB/MG 147.959.