Autor: Paulo Sérgio Ribeiro da Silva*
A política econômica praticada no Brasil ao longo destas três últimas décadas vem transferindo, sistematicamente, a renda do setor produtivo e dos cidadãos para as instituições financeiras e aplicadores.
Há anos o Brasil pratica elevadas taxas reais de juros acima de 7%. Atualmente, estão acima de 10% — considerada a 2ª maior do mundo.
A política de manter os juros em patamares elevados faz aumentar a relação DÍVIDA/PIB, já que o governo contrai novas dívidas para pagar os juros, em sentido contrário aos objetivos da política monetária de combater o crescimento da dívida bruta e atingir o equilíbrio fiscal.
A grande mídia e os analistas do mercado, formadores de opinião, continuam a focar no déficit primário (0,25 do PIB), sem se aprofundarem no fato de que o TRILHÃO de reais de juros que já estão sendo pagos anualmente pelo Tesouro, aumenta o endividamento real e representa cerca de 8% do PIB.
As consequências perversas no longo prazo não têm merecido a devida atenção da sociedade brasileira. A correlação entre o nível de endividamento do Estado e a taxa real de juros não é debatida no país. A manutenção dessa política resultará em sérios desequilíbrios no longo prazo. O endividamento do Estado Brasileiro é, atualmente, de 78,5 % do PIB.
Países como Estados Unidos, Canadá, Japão, China, Cingapura e grande parte dos países da Europa, considerados de economia estável, convivem há décadas com indicadores muito superiores aos do Brasil (vários acima de 100%) e vêm conseguindo investir em infraestrutura e no desenvolvimento social.
Estes países praticam, historicamente, juros REAIS inferiores a 2%.
O governo, recentemente, criou um fundo de aval para garantir operações de crédito consignado. Consequência real, mas pouco evidenciada, é que estas operações comprometem a renda dos pensionistas e assalariados que perderão o poder de compra futuro – uma profunda deturpação do espírito do FGTS!
O cenário se torna cada vez mais sombrio ao vermos que as projeções do BC sinalizam juros nominais de dois dígitos para os próximos anos.
As empresas que investiram nos anos de 2018 a 2022, com juros inferiores a 6%, estão pagando taxas superiores a 15%.
Os balanços das empresas evidenciam que as despesas financeiras estão corroendo, de maneira nunca experimentada, o resultado da maioria delas. Como reflexo desse cenário, observa-se um grande aumento das recuperações judiciais.
O governo precisa compreender que as empresas são fundamentais à manutenção de um bom nível de emprego e são, na realidade, as garantidoras das arrecadações futuras.
Juros altos vêm provocando a redução da participação relativa da indústria no PIB brasileiro, diante da impossibilidade de investir em novas tecnologias.
Em contraste, quando a política de juros esteve mais equilibrada, a sociedade brasileira colheu resultados positivos, o que propiciou o crescimento e a modernização de segmentos econômicos, a exemplo do agronegócio e o setor exportador.
O agronegócio sempre teve juros subsidiados (equalização), e as exportadoras gozam de incentivos fiscais e operam uma dinâmica específica de financiamento através do mercado de câmbio, o que é saudável e positivo.
Contudo, há um grande número de empresas, de vários setores, que enfrenta essa perigosa conjuntura, não por deficiência de gestão, mas por fatores exógenos, como as taxas de juros, sobre as quais não exercem nenhum poder ou controle.
É hora de o governo agir no sentido de permitir que estas empresas continuem viáveis, pagando impostos e gerando empregos.
Finalizando essas considerações, entendo pertinente a criação de linhas especiais de longo prazo no BNDES, a juros suportáveis, para refinanciar os empréstimos que foram contratados nos anos de 2018 a 2022, quando a Selic era próxima de 5%.
Sugiro, ainda, que a política econômica vigente seja debatida no Conselho Monetário Nacional, com participação dos principais agentes econômicos, para avaliação mais aprofundada de seus impactos na sociedade.
Rever a política de juros não é apenas uma escolha técnica, mas uma decisão estratégica para recolocar o país em trajetória sustentável de crescimento e socialmente equilibrado.
*Empresário, Vice-Presidente da Diretoria Executiva da ACMINAS – Associação Comercial e Empresarial de Minas e membro do Fórum JK de Desenvolvimento Econômico
E-mail: paulo.sergio@tora.com.br
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